quarta-feira, março 25, 2009

[sem radar]


Estava hoje no Hospital Militar visitando a minha avó, que está em observação. Do corredor eu podia ouvir alguns ruídos, alguns gritos meio abafados, mas que não pareciam ser de dor.
Minha vó então comentou comigo que os gritos eram da garota do quarto ao lado, que havia sofrido um derrame durante o parto e a família havia a deixado no hospital, sem nunca mais a visitar, há quatro meses.
Chamei o enfermeiro e perguntei mais sobre a menina que estava lá.
Ele me perguntou se eu gostaria de conhecê-la, pois ela ficava feliz quando recebia alguém.
Fui acompanhada do enfermeiro e quando cheguei no quarto, confesso que fiquei um pouco chocada com a cena.
Ela tinha os braços e as pernas atrofiados, apesar da fisioterapia que ela recebia no hospital. A boca já possuía poucos dentes e ela não conseguia falar por causa do derrame, meio de lado, o enfermeiro a puxou para seus braços e disse:
- Lu, tem visita! É uma moça da sua idade! Veja, ela veio te ver!
O enfermeiro me contou pouco mais sobre ela.
Que seu nome é Luciana, 28 anos, casada e mãe de três filhos. No parto do terceiro, teve complicações que afetaram seriamente seu cérebro. Desde então ela não saiu mais da cama e nem de seu mundo solitário e silencioso, que era quebrado somente pelo seu lamento cantado aos gritos, que invadiam os corredores daquele hospital.
A família não a visitava nunca, ela já havia recebido alta há alguns meses e ninguém veio buscar.
Desde então ela ficou ali, sendo mantida pelo hospital e pelos funcionários que a "adotaram".
Ela ali só tem o carinho incontestável dos enfermeiros, inclusive do Sargento da Silva, que foi quem me levou até o quarto e demonstra um afeto e dedicação ímpares por aquela moça.
Saí daquele quarto visivelmente abalada, pensando "que mundo a Lu tem em volta dela, se ela mal consegue olhar pela pequena janela do quarto?"
"Como uma família desiste de alguém assim, sem olhar pra trás?"
"Em que mundo ela se encontra agora, alma presa, sufocando a dor pelos gritos esquecidos..."
Ela poderia ser eu, quase a mesma idade. E quem sabe ela era eu antes do derrame. Quem sabe eu seja um pouco dela ali naquele quarto, solitária, esquecida.
Queria naquele momento poder trazê-la ao meu mundo, mostrar que as coisas aqui continuam belas e coloridas. Que ainda há árvores bonitas e prédios altos, mas que ainda temos pessoas dobrando a esquina e sendo deixadas para trás.
Mas ela não sabe disso. Nem eu. Ela só sabe dos enfermeiros que a tratam com amor, e que alguém de vez em quando entra naquele quarto para quebrar a solidão por alguns instantes e depois partir novamente.
E eu que não sei de tantas coisas, não sei da minha própria solidão, fico imaginando se ela consegue compreender a solidão incompreensível na qual ela vive.
Queria só abraçá-la e que ela soubesse que ela não está só. Que alguém neste mundo escreveu algumas linhas para contar a história da moça solitária que mudou um pouco a alma de outra pessoa....

Um comentário:

Nonoca disse...

só vc pra me fazer chorar essa hora da manhã

:P

Nota mental: não ler o teu blog de TPM

hahha

te amo